Ser viticultor em 1931

“Quantas vezes o nosso bom lavrador ao trincar a vide no podão pensará deste ou semelhante modo: Agora começa a poda, logo após a adubação e a seguir a empa. Depois de rebentar a vinha terei em mãos as contínuas incómodas sulfatagens a que me obriga o Sr. míldio e as pulverizações de enxofre que tanto me fazem arder os olhos quando à noite os procuro cerrar para me entregar nos braços de Morfeu, e me roubam um bom pedaço de sono que tanto me sabe depois de um dia deste trabalho! Mas se fosse só isto! E as esfolhas! É verdade, também as tenho de fazer.
Mas ainda não é tudo, a cava da vinha também não a posso deixar para trás. Ah! fortes dias de incómodo trabalho me vai dar ela! Quando penso que terei de andar dias quase inteiros de joelhos a cavar debaixo das latadas e, algumas vezes, até de rojo como uma cabra, enchendo a boca e os pulmões de pó, fico com o miolo a andar à volta.
Mas depois disso é preciso dar-lhe uma rega! E a água!
O sol tem secado as fontes todas.... Se continuar esta estiagem como poderão as fontes rebentar? E a pouca água que ainda fica por que preço a poderei comprar por hora?
Depois de tanto trabalho que me deixarão para vindimar o Sr. míldio mais o seu compadre oídio e essa senhora a que chamam gota que agora também entendeu se juntar aqueles nossos amigos para ajudá-los a dar cabo de uma cultura que tanto trabalho nos custa?
No fim de tudo isto, por quanto posso vender um barril de vinho?
Ai as minhas dívidas! E os vendeiros não me querem já fiar mais.
Com o produto da minha colheita poderei saldar as minhas contas?
Lá com o bordado da minha mulher e das pequenas nem sequer conto, ele mal dá para as linhas e para o sal que se deita no milhinho que ainda com muito custo me fiam.
Isto vai dar bom valha-nos Deus”  .
 
 

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